
Felca, Hytalo e o silêncio conveniente: até onde vai a responsabilidade de quem tem voz?
Nos últimos dias, as redes sociais foram sacudidas por um assunto sério e incômodo: as denúncias contra o influenciador Hytalo Santos. O caso, que já era de conhecimento de alguns criadores de conteúdo, voltou ao centro do debate após o vídeo gravado pelo youtuber Felca.
Priscila Tostes.
8/12/20253 min read
Nos últimos dias, as redes sociais foram sacudidas por um assunto sério e incômodo: as denúncias contra o influenciador Hytalo Santos, sobre a exploração e sexualização de menores na internet. O caso, que já era de conhecimento de alguns criadores de conteúdo, voltou ao centro do debate após o vídeo gravado pelo youtuber Felipe Bressanim Pereira, o Felca.
A reação em cadeia foi imediata: influenciadores, que até então se mantinham em silêncio, começaram a se posicionar. Mas fica a pergunta: por que só agora? Por que a denúncia só ganhou força quando um nome grande decidiu falar?
Silêncio seletivo e o peso do engajamento
Não é de hoje que vemos criadores de conteúdo agirem com rapidez para divulgar determinados assuntos — especialmente aqueles que rendem cliques, visualizações e, consequentemente, dinheiro. É o caso das propagandas de jogos como “tigrinho”, que apesar de prejudicarem famílias inteiras, são amplamente divulgadas porque garantem retorno financeiro.
Já crimes graves, como a exploração sexual de menores, raramente recebem o mesmo destaque. Denunciar não traz patrocínio, não gera receita e, muitas vezes, ainda cria atrito com marcas e seguidores. A escolha do que falar — e do que silenciar — não é, portanto, apenas uma questão de desconhecimento, mas muitas vezes de conveniência.
Plataformas que fecham os olhos
Outro ponto que chama atenção é o papel das próprias plataformas, comentários inofensivos ou opiniões moderadas são removidos ou censurados com frequência. Falo por experiência própria, vários comentários meus já foram removidos, por exemplo: dizer que alguém é resistente ao conhecimento ou quando eu disse que o jeito era devolver o Brasil para os índios.
O que é mais grave: meus comentários ou a conduta do Hytalo? Causa estranheza que conteúdos claramente criminosos, como aqueles que o referido influenciador publicava, permanecessem no ar.
Por quê? A resposta parece estar no mesmo lugar que explica o silêncio seletivo: retenção de público. Se o conteúdo mantém as pessoas presas na tela, gera engajamento e, portanto, lucro para a plataforma. A gravidade do crime parece pesar menos do que a métrica de tempo de visualização.
Essa contradição escancara uma questão ética: até que ponto empresas bilionárias estão dispostas a permitir que crimes sejam expostos — e até incentivados indiretamente — em nome do lucro?
Influenciadores: entre a omissão e a responsabilidade
Quando se fala de crimes contra vulneráveis, silêncio também é uma forma de conivência. Criadores de conteúdo com milhões de seguidores não são apenas “pessoas comuns com opiniões”, como eu e você, mas formadores de opinião que influenciam a percepção pública.
Falar exige coragem, sim! Mas não falar, por medo de perder contratos ou de desagradar parte do público, é uma escolha que favorece a continuidade da violência. É uma omissão que, no mínimo, levanta dúvidas sobre a coerência de quem, em outras situações, se apresenta como defensor de causas sociais.
A responsabilidade não é apenas moral, mas também social. Influenciadores têm o poder de alertar, educar e mobilizar. Ignorar esse papel, especialmente quando o assunto é a proteção de menores, é desperdiçar uma oportunidade de mudar realidades.
O que realmente importa?
O caso Hytalo expõe, mais uma vez, a lógica distorcida que governa boa parte do meio digital: o que importa é o que vende, não o que é certo. Se o assunto rende lucro, ele é amplificado, se não traz retorno, é ignorado. Não se trata de esperar que todos os criadores se transformem em jornalistas investigativos ou ativistas em tempo integral, mas é legítimo cobrar coerência, senso de prioridade e, principalmente, humanidade.
Enquanto o engajamento for mais valorizado que a dignidade humana, veremos crimes sendo usados como entretenimento, e denúncias sendo feitas apenas quando o “timing” e o impacto de imagem são convenientes. O público, por sua vez, também tem um papel: escolher quem seguir, apoiar e compartilhar, priorizando quem realmente contribui para um espaço digital mais ético e seguro.
No fim das contas, talvez a grande pergunta seja: que tipo de internet estamos ajudando a construir? Uma que denuncia e protege, ou uma que lucra e se cala?


